Justiça autoriza pente-fino nas contas do ex-governador Marcelo Miranda

Ex-governador, o pai dele, José Edmar Brito Miranda, e seu irmão, Brito Miranda Júnior, foram presos nesta quinta-feira, em caráter preventivo.

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O juiz substituto João Paulo Abe, da 4ª Vara Federal de Palmas (TO), atendeu o pedido do Ministério Público Federal (MPF) e ampliou a quebra dos sigilos bancário e fiscal do ex-governador de Tocantins, Marcelo Miranda (MDB), bem como de seu pai, José Edmar Brito Miranda, e de seu irmão, Brito Miranda Júnior. Os três foram presos esta manhã, em caráter preventivo, por suspeita de integrar uma organização criminosa supostamente envolvida com corrupção, peculato, fraudes em licitações e outros crimes.

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Além de expedir três mandados de prisão preventiva e 11 de busca e apreensão de documentos em endereços residenciais e comerciais ligados aos suspeitos, o magistrado determinou a ampliação da quebra dos sigilos fiscal e bancário já determinado em outras fases das investigações. Com isso, o juiz estendeu o período a ser analisado, que compreenderá todas as movimentações feitas entre janeiro de 2005 e agosto de 2019.

Para o MPF, a investigação sobre as contas bancárias dos três integrantes da família Miranda, bem como de empresas suspeitas de ligação com o suposto esquema criminoso investigado em conjunto com a Polícia Federal (PF) e com a Receita Federal, é necessário para “ratificar os indícios de lavagem de capitais, cuja continuidade perduraria até os dias de hoje”, mesmo com as investigações já tendo se tornado públicas há tempos.

“A documentação que embasa o pedido teve por fundamento os elementos de convicção reunidos a partir da celebração de termos de colaboração premiada homologados pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, instruídos por diversos outros documentos de corroboração, que tornaram clara a percepção de vantagens indevidas da ordem de centenas de milhões de reais”, justifica o juiz antes de mencionar a “sofisticação e a blindagem patrimonial do grupo”, suspeito de “adotar sofisticados esquemas de lavagem de capitais”.

Foto: Divulgação

Em sua decisão, Abe também decreta o afastamento do sigilo bancário e fiscal da Construtora Construarte Eireli; de Guilherme Costa de Oliveira e de Luciano Carvalho Rocha. Segundo o MPF, Marcelo Miranda, seu pai e seu irmão fundaram a construtora e a registraram em nome de Oliveira, cuja “vida modesta não condiz com a rotina formal de empresário sob cuja responsabilidade teriam sido assinados contratos de até R$ 4 milhões, apenas [durante] 2016”.

Para o MPF, Oliveira não passa de um “laranja” no esquema montado pelos integrantes da família Miranda – que, segundo a PF, usaram de sua influência política para “aparelhar o estado, mediante a ocupação de cargos comissionados estratégicos para a atuação da organização criminosa”.

Na decisão, o juiz ainda comenta que a Construarte era administrada por Luciano Carvalho Rocha, “provável laranja de Marcelo Miranda também na empresa WTE Engenharia”, outra das empresas que já vinham sendo investigadas e contra as quais o magistrado ampliou o afastamento do sigilo fiscal e bancário.

O juiz federal também determina que a Unidade de Inteligência Financeira (antigo Coaf), do Banco Central, verifique e aponte quaisquer operações suspeitas nas contas dos investigados entre janeiro de 2005 e 13 de agosto deste ano. E autoriza o compartilhamento de informações entre os vários órgãos que acompanham as investigações para que possam “instruir ação penal”.

Operação 12º Trabalho é um desdobramento de outras investigações que, segundo a PF, já obtiveram indícios de que os suspeitos integram uma organização criminosa responsável por causar um prejuízo de mais de R$ 300 milhões aos cofres públicos.

O ex-governador que já foi recambiado para Palmas foi detido no apartamento funcional ocupado pela mulher dele, a deputada federal Dulce Miranda (MDB), em Brasília. Já o pai dele. Brito Miranda, foi detido em Palmas e irmão, Brito Júnior, numa fazenda em Santana do Araguaia (PA).  

Homicídios e tortura no Pará

Possível participação da família Miranda em um triplo homicídio ocorrido no Estado do Pará foi levantada em delação premiada de um dos homens apontados como ‘laranja’ do grupo. O ex-governador do Tocantins, Marcelo Miranda (MDB), seu pai José Edimar Brito Miranda e irmão Brito Júnior foram presos na Operação 12º trabalho da Polícia Federal nesta quinta-feira (26).

As revelações constam na decisão do juiz federal João Paulo Massami Lameu Abe, da 4ª Vara Federal de Palmas, que autorizou a operação da Polícia Federal.

Segundo o delator, o agropecuarista Alexandre Fleury Jardim, os assassinatos ocorreram entre 23 e 24 de junho de 2013 nas imediações da Fazenda Ouro Verde, em São Félix do Xingu (PA), que estava no nome de Fleury, mas pertence, na verdade, ao ex-governador, o pai dele e ao irmão.

Naquela ocasião, foram mortos Warlyson Gomes de Sousa, Nerivan Nava Fontineli e Igor Lázaro Alves de Sousa. A execução teria sido feita por policiais. Fleury informou ainda que outros dois homens, Francisco Neto Pereira da Silva e Luciano Ferreira Lima, foram mantidos em cárcere privado e torturados com o fim de obter informações, tudo por ordem da família Miranda.

De acordo com o Ministério Público Federal, o possível envolvimento deles no triplo homicídio apenas se tornou evidente após a delação de Alexandre Fleury. O delator disse ainda que chegou a se desentender com os donos de fato da propriedade [Família Miranda] e eles temiam perder a terra.

Fiança para Brito Miranda

O pai do ex-governador Marcelo Miranda, José Edmar Brito Miranda, vai poder responder ao processo em liberdade. O juiz federal João Paulo Abe estipulou uma fiança no valor de 200 salários mínimos, cerca de R$ 200 mil, para substituição da prisão preventiva dele. O juiz levou em consideração a idade avançada, de 85 anos e o estado de saúde do investigado.

O ex-governador, que também foi preso, ainda não passou pela audiência de custódia. Ele está na sede da Justiça Federal em Palmas e deve ser ouvido pelo juiz até o fim do dia.

Por ser advogado com registro ativo na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Brito Miranda foi encaminhado para uma sala de estado maior, no Comando da Polícia Militar, em Palmas. Ele ficará lá até que o pagamento da fiança seja comprovado

O esquema

Conforme a decisão judicial, Brito Miranda, pai do ex-governador, e Brito Miranda Júnior, irmão, funcionavam como pontos de sustentação para “um esquema orgânico para a prática de atos de corrupção, fraudes em licitações, desvios de recursos, recebimento de vantagens indevidas, falsificação de documentos e lavagem de capitais, cujo desiderato [finalidade] era a acumulação criminosa de riquezas para o núcleo familiar como um todo.”

Os investigadores concluíram que os atos ilícitos eram divididos em sete grandes eixos, envolvendo empresas, fazendas, funcionários públicos e laranjas, “que se relacionavam organicamente entre si para o desenvolvimento exitoso das atividades criminosas, mas que funcionavam como grupos formalmente autônomos e independentes, sempre apresentando Marcelo Miranda, Brito Miranda e Brito Júnior como elo de ligação”.

A decisão aponta ainda que, durante as investigações, foram verificados episódios de falsificação de escrituras públicas e registros de imóveis vinculados à família para promover a ocultação e blindagem patrimonial. Também há indícios de ameaças a testemunhas, compra de depoimentos e destruição de provas.

A investigação ainda apontou a utilização de equipamentos de contrainteligência para dificultar e impedir a investigação pelas autoridades policiais. “Assim como a rara utilização do sistema bancário legalizado, consoante teria restado claro a partir do insucesso das medidas de bloqueio determinadas pelo eminente ministro Mauro Campbell Marques”, diz a decisão.

O texto da decisão afirma que a sucessão de atos de investigação não resultou no desmantelamento da organização criminosa, que continuaria em pleno funcionamento através de prepostos. A lavagem de dinheiro se daria pela aquisição de fazendas, aviões, veículos e gado mediante a ausência de escrituração em nome de laranjas.

Caminhonete de presente para desembargador

A Polícia Federal encontrou indícios de que o ex-governador do Tocantins Marcelo Miranda (MDB), presenteou o desembargador Ronaldo Eurípedes com uma caminhonete modelo ‘Hilux’. O veículo teria sido adquirido quando Miranda ainda era governador e Eurípedes presidia o Tribunal de Justiça do Tocantins.

A informação consta na decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. De acordo com o documento, o presente seria para que o TJ firmasse contratos com a empresa Construarte Construção Eireli, que os investigadores acreditam ser de um ‘laranja’ de Marcelo Miranda.

Durante toda a presidência de Ronaldo Eurípedes o Tribunal de Justiça fechou quatro contratos com a empresa que totalizam mais de R$ 1,4 milhão, todos no ano de 2016. Atualmente o magistrado ainda faz parte da composição da corte, mas não ocupa mais a presidência.

O veículo foi descoberto durante a Operação Toth, também da PF, que teve o desembargador como alvo. Na época, ele era investigado por supostas vendas de sentenças em processos que não estão relacionados com a família Miranda.

Segundo relatado pela PF, foram encontrada três caminhonetes do mesmo modelo com o desembargador. A única que estava quitada e sem nenhum tipo de restrição é a que teria sido comprada pelo ex-governador. A polícia acredita que ela foi adquirida em uma concessionária de Goiânia.

Outro Lado

O Tribunal de Justiça do Tocantins informou que não vai comentar o caso.

O desembargador Ronaldo Eurípedes informou que o fato citado pelo magistrado de piso da Justiça Federal juiz substituto João Paulo Abe, em processo do qual o Desembargador não é parte, já é objeto de instrução em Inquérito que tramita sob sigilo no Superior Tribunal de Justiça, ainda aguardando juntada de relatório final da Superintendência da Polícia Federal em Palmas, como determinado pelo Ministro OG FERNANDES ainda em fevereiro do corrente ano.

Disse ainda que a inadvertida citação do fato na decisão relativa ao ex governador Marcelo Miranda não se revela adequada, seja pela publicidade dada, seja pela prematuridade do Inquérito no STJ. Afirmou que os contratos firmados com a empresa citada no ano de 2016, foram formalizados em processo regular de licitação, contratação e execução, seguindo todos os procedimentos, normas e controles do Tribunal de Justiça, como foram todos aqueles firmados no biênio 2015/2016, tramitando inclusive em meio eletrônico, o que garante a transparência e higidez de todos os atos.

A nota afirma ainda que, seguindo a sistemática de contratação no âmbito da administração pública, a participação do Desembargador enquanto Presidente do TJTO foi como ordenador de despesas, se dando tão somente na homologação da licitação, assinatura do contrato e ordens de pagamento após rigorosa averiguação dos órgãos de controle interno quanto a regularidade e entrega dos serviços, não havendo sequer contato direto e pessoal com prestadores de serviços, porque como dito, os processos são em sua totalidade na forma eletrônica.

A defesa do ex-governador Marcelo Miranda, do pai e do irmão dele disse que as prisões foram sem fundamentos, que os fatos citados são antigos, foram denunciados no processo da operação Reis do Gado e que ainda aguardam decisão judicial sobre eles.

A esposa de Marcelo Miranda, a deputada federal Dulce Miranda, emitiu nota afirmando que não tem acesso ao processo investigativo. Ela disse que como esposa, tem plena convicção da inocência e da integridade do marido e que estendo a mesma confiança ao sogro e ao cunhado.