Homem negro de até 30 anos e da periferia é o perfil de mortos na onda de homicídios em Palmas em 2023

A Capital teve 65 assassinatos entre janeiro e 15 de maio. Dos inquéritos abertos pela Delegacia de Homicídio em 2023, apenas sete foram finalizados.

Compartilhe:

Homens pretos ou pardos que vivem na periferia e têm entre 20 e 30 anos formam a maioria das vítimas de assassinato em Palmas em 2023. A onda de violência fez aumentar em mais de 200% o índice de mortes na capital, comparado ao ano passado.

>> Siga o canal do "Sou Mais Notícias" no WhatsApp e receba as notícias no celular.

Palmas tem vivenciado uma verdadeira explosão nos casos de assassinatos. O alto índice começou a ser registrado ainda no segundo semestre de 2022 e se manteve nos primeiros meses de 2023. Neste ano, a cidade teve média de uma morte a cada dois dias.

Em entrevistas, o secretário de segurança, Waldemir Costa Mota, vinha dizendo que os crimes teriam como alvo pessoas com passagem pela polícia. No entanto, os dados mostram que mais da metade não tinha ficha criminal.

A polícia informou que tem investigado e aumentado o policiamento.

Homicídios em Palmas até 15 de maio
Raio-X

As informações fazem parte de um levantamento feito pela ouvidoria da Secretaria de Segurança Pública (SSP). Os dados mostram um raio-x dos homicídios registrados em Palmas entre 1º de janeiro de 2023 e 15 de maio. Neste período foram 65 assassinatos na cidade.

Em comparação com o ano passado, quando tinham sido 20 mortes no mesmo período, o aumento é de 225%. Pelo menos mais cinco pessoas foram mortas na cidade desde o dia 15 e não entraram neste balanço.

Perfil das vítimas:

  • 62 são homens
  • 55% têm até 30 anos
  • 69% é preto ou pardo
Perfil das vítimas de onda de violência em Palmas – Foto: Arte g1

Entre as vítimas recentes está Victor Gabriel Alves Saraiva dos Santos, de 18 anos, brutalmente assassinado durante uma ida ao supermercado. Segundo a família, ele trabalhava como auxiliar num viveiro de eucalipto em um assentamento.

“Ele saía todo dia às 6h e chegava às 17h. Quando ele não estava no campinho, ele estava no quarto dele, não era menino de rua, de farra, de bebedeira. A gente quer um esclarecimento pela morte do Victor”, comenta a tia do jovem, Lilian Alves.

Um dos assassinatos, registrado em fevereiro, envolvendo uma pessoa em situação de rua foi registrado por câmeras de segurança. A vítima, que tinha 42 anos, foi abordada por dois homens e morta com golpes de um cabo de vassouras.

Em março, criminosos invadiram uma casa no Jardim Aureny I e balearam dois jovens e duas crianças. Um menino de quatro anos morreu na hora, um jovem de 22 anos morreu dias depois no hospital.

Dos 65 homicídios registrados na capital, entre 1º de janeiro e 15 de maio, 39 foram em bairros da região sul da capital, que são mais populosos e afastados do centro. Isso equivale a 60% do total de mortes.

O bairro com maior número de assassinatos foi o Jardim Taquari, localizado a cerca de 20 km do centro de Palmas. Local que é constantemente alvo de reclamações dos moradores pela falta de infraestrutura.

Veja lista dos bairros com mais crimes:

  • Jardim Taquari – 5 homicídios
  • Aureny II – 4 homicídios
  • Aureny III – 4 homicídios
  • Setor União Sul – 3 homicídios
  • Aureny I – 3 homicídios
  • Morada do Sol – 3 homicídios

Conforme os dados, oito homicídios foram em quadras na região central da cidade e mais sete em bairros da região norte. Outros 11 assassinatos não tiveram o endereço confirmado ou identificado.

Mapa mostra assassinatos em Palmas entre 1º de janeiro e 15 de maio – Foto: Arte g1

Investigação

Segundo os dados da Lei de Acesso à Informação, dos 65 inquéritos de homicídio abertospara investigar as mortes em 2023, apenas sete foram finalizados. Em seis deles o autor do crime foi identificado e um dos casos foi finalizado sem identificação do assassino. A polícia não informou porque foi concluído sem a identificação.

Apesar do baixo índice de resolução, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) disse que 31 pessoas foram presas em 2023 suspeitas de envolvimento com assassinatos na capital. No dia 12 de maio, cinco homens foram encontrados com armas em um carro e a SSP disse que eles também são suspeitos de mortes.

Em entrevistas, o secretário de segurança, Waldemir Costa Mota, vinha dizendo que os crimes teriam como alvo pessoas com passagem pela polícia. Os dados mostram que das 65 vítimas menos da metade tinha ficha criminal: 30 pessoas.

Sobre isso, a secretaria que informou que há oito casos ainda sob análise, o que pode mudar a informação. Não há confirmação se os oito são de pessoas com histórico criminal. (Veja nota completa abaixo)

A SSP informou que em 2023 foram abertos 90 inquéritos na 1ª DHPP – Palmas, para investigar homicídios, feminicídios e tentativas de assassinato. Destes 90 inquéritos, segundo a pasta, dez foram concluídos. (Leia a nota na íntegra no fim da reportagem)

Uma criança morreu e outra fica ferida em tiroteio no Aureny I — Foto: Arthur Girão/g1 Tocantins
Uma criança morreu e outra fica ferida em tiroteio no Aureny I — Foto: g1 Tocantins

Problema crônico

O ciclo de violência que a capital vivencia é atribuído pelas forças de segurança à presença cada vez mais frequente de grupos criminosos. A própria polícia aponta que a situação não pode ser tratada apenas como problema de segurança pública.

“A gente precisa sair desse ciclo em que há uma crise, a polícia atua, prende os principais responsáveis, há uma redução e em seguida um novo aumento. A gente precisa findar o recrutamento desses jovens de periferia e para isso precisa de políticas públicas que impeçam que os jovens de 15, 16 anos ao invés de optar por um caminho correto, de trabalho, eles acabam optando pelo caminho de ingressar no crime organizado. E esse ciclo não tem fim”, comentou o delegado de homicídios Eduardo Menezes.

O porta-voz da Polícia Militar (PM), major Marcos Morais, disse que o policiamento estava sendo reforçado na cidade com a chegada de novos policiais.

O Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (Gaesp), do Ministério Público Estadual, convocou uma audiência pública para tratar sobre políticas públicas que podem ser implementadas com o objetivo de reduzir os índices de homicídio no estado, em especial na capital.

Para o professor Igor de Andrade Barbosa, especialista em direto penal e segurança pública, os números retratam a ineficiência de um sistema penal que não é capaz de resolver o problema da violência sozinho.

“A subida íngreme no percentual de homicídios no Estado pode estar atrelada a diversos fatores, como o protagonismo de organizações criminosas e facções em disputas por territórios, distribuição e pontos de venda de entorpecentes, com o aumento da circulação de armas de fogo, com o rastro de destruição deixado pela pandemia de covid-19, com seus reflexos socioeconômicos, e psicossociais nefastos”.

Ele destaca que é preciso investimento em inteligência, novas tecnologias e cooperação entre instituições, além do investimento em políticas públicas.

“Entretanto, sem políticas públicas sociais inclusivas, sem educação, esporte, cultura, renda e lazer, ou ainda, sem um efetivo combate ao racismo estrutural, à marginalização social e ao desequilíbrio econômico gerador de concentração de renda e desemprego, a segurança pública continuará “enxugando gelo”, tentando combater o efeito, não a causa [origem] da violência e da criminalidade”, finalizou.

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública afirma que tem fortalecido a 1ª Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa – 1ª DHPP de Palmas, com aumento do efetivo (delegados, agentes e escrivães) e implementou o regime de plantão aos finais de semana e feriados. Além de realizar operações com outras forças de segurança. (Veja a nota completa abaixo)

O que diz a Secretaria de Segurança Pública

A Secretaria da Segurança Pública do Tocantins (SSP-TO) esclarece que os dados podem variar diariamente. Vale destacar que os dados divulgados referem-se aos Boletins de Ocorrência que conforme o desenrolar dos inquéritos policiais podem ter a natureza e dados dos envolvidos modificados.

De acordo com setor de inteligência da SSP-TO, entre os homicídios registrados na Capital, no período de 1º de janeiro a 19 de maio de 2023, em 45% deles, as vítimas possuem algum histórico policial, número que pode ser maior, vez que oito ocorrências ainda necessitam de validação de todos os seus dados.

Quanto ao número de inquéritos policiais em aberto, vale destacar que as investigações relacionadas aos crimes de homicídios têm, por sua natureza, um caráter complexo, que demanda um tempo maior de investigação, desde a abertura até a conclusão. Sendo assim, é correto afirmar que dos 90 inquéritos instaurados neste ano pela 1ª Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa (1ª DHPP – Palmas), referentes a crimes de homicídio, feminicídio e tentativa de homicídio, dez já foram concluídos.

Quanto ao número de prisões ser maior que o número de inquéritos concluídos, é importante esclarecer que, um inquérito policial não se encerra com a prisão do suspeito, principalmente, quando o crime possui mais de um autor.

Ao longo deste ano, a 1ª DHPP de Palmas realizou 31 prisões, as quais incluem casos de anos anteriores, crimes com mais de um autor e de prisões com inquérito que segue em aberto. O fato de a prisão corresponder a um caso de ano anterior ou do ano corrente, não invalida o trabalho desempenhado pela 1ª DHPP que atua para elucidar os crimes independente da data da ocorrência. Mesmo porque, dentre as várias prisões realizadas esse ano, algumas resultaram na captura de membros de organizações criminosas envolvidos tanto em homicídios cometidos no ano passado quanto em 2023, em especial no início do mês de maio.

Sobre as medidas adotadas para o enfrentamento da violência na Capital, a SSP-TO reitera que realiza um trabalho contínuo de combate aos diversos tipos de crimes. No que diz respeito à ocorrência de homicídios, somente nos primeiros meses do ano, a SSP/TO fortaleceu as delegacias especializadas, a exemplo da 1ª Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa – 1ª DHPP de Palmas. A unidade passou por uma reestruturação com o aumento do efetivo (delegados, agentes e escrivães) e implementou o regime de plantão aos finais de semana e feriados.

Além disso, a Segurança Pública ampliou o número de operações especiais e, juntamente com outras forças de segurança, mantém permanente a Operação Tolerância Zero, que tem combatido as organizações criminosas e seus crimes correlatos e dado respostas satisfatórias à sociedade.

Por G1